Moro abandona o barco com denúncia contra o presidente e libera naufrágio
Finalmente o agora ex-ministro Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública) conseguiu um bom motivo para abandonar o barco no meio do naufrágio. Saiu por cima. Denunciou o desejo de interferência explícita do presidente Jair Bolsonaro sobre as investigações da Polícia Federal que implicam seus três filhos (Flavio, no caso Queiroz; Eduardo, no inquérito das fake news, e Carlos, nas investigações sobre o "gabinete do ódio" e o financiamento das manifestações antidemocráticas). Delatou a tentativa de interferir na autonomia da superintendência da PF no Rio, próxima das investigações sobre o assassinado de Marielle Franco envolvendo as milícias.
O ex-ministro deixa o presidente em situação extremamente delicada. Abre espaço para um impeachment com evidências concretas de crime de responsabilidade em afronta à Constituição. Ao mesmo tempo, pavimenta o caminho até uma candidatura em 2022. Moro agrada os eleitores menos extremistas, que escolheram Bolsonaro sob a bandeira do combate à corrupção. Não mexe nos cerca de 12% do núcleo duro, que exigem o fim da quarentena e defendem um golpe militar. Mas movimenta essa base de eleitores antipetistas descontentes com o governo atual.
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Moro, no entanto, deixa o cargo no meio de uma pandemia que ele não soube manejar. Sua gestão na pasta da Justiça e Segurança Pública incentivou o encarceramento em massa e agora os presídios são vetores do coronavírus. Tentou esconder os casos de presos e policiais penais infectados – que chegam a mais de 100 apenas na Papuda, por exemplo – e defendeu o uso de contêineres metálicos para isolar presos em situação de risco, como idosos e doentes. Propagandeou a soltura de líderes do crime organizado como se esse fosse o caso preponderante entre as recomendações do Conselho Nacional de Justiça, o que não é verdade. Moro não soube gerir a crise na pandemia.
Agora abandona o barco em pleno naufrágio. O presidente Bolsonaro está cada vez mais isolado. Teve de se movimentar a favor de deputados e senadores fisiologistas. Em seu apoio ficam os militares, os olavistas e os evangélicos. No Congresso, a bancada da bala ainda o apoia. Porém, a pandemia é mais forte que qualquer medida do presidente que tente agradar esses deputados, preocupados com a exposição de policiais e agentes de segurança à Covid-19. Estão morrendo da doença.
O agronegócio também não está contente com Bolsonaro, que deixa seus filhos e ministros como Abraham Weintraub (Educação) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores) afrontarem a China, principal parceiro comercial do Brasil e do agronegócio. A ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM), fica em situação difícil e constrangedora.
O ministro Paulo Guedes (Economia) também tem sido escanteado. Entra aí a sua falta de experiência em lidar com questões sociais e em dialogar com outros ministros, além da proposta de ministros generais no plano de desenvolvimento sem a participação de Guedes. Ele e Moro eram as promessas de compromisso com o país alardeado pelo presidente Jair Bolsonaro quando foi eleito, em 2018. Lembrando que, se o presidente for afastado, quem assume é o general Mourão.
Agora Moro sai afirmando que segue comprometido com o país. Não é ingênuo: sabia no que estava se engajando. Está pronto para assumir cargos em governos estaduais e ofertas não faltarão. Wilson Witzel (PSC) foi o primeiro a lançar um convite pelo Twitter. O ex-ministro também tem em seu apoio o mercado financeiro e empresários. Não é à toa que a Bolsa de Valores reage em queda e o dólar, em alta. Vale lembrar que esta semana Moro participou de uma live do Itaú Personnalité e, há duas semanas, em outra promovida pela corretora XP.
Enquanto isso, o Brasil vive uma pandemia e é administrado, na prática, pelos generais militares. É importante observar como vão reagir às acusações do ex-ministro Sergio Moro. Bolsonaro mostra que fará de tudo para defender seus filhos, custe o que custar. Inclusive vidas. Inclusive a própria política.
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